300 anos. Esse é o tempo – ou melhor, a distância – que estamos de alcançar a igualdade de gênero, segundo o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres. Os direitos das mulheres são historicamente cerceados, e à medida que crises e conflitos acontecem são um dos primeiros a serem colocados em xeque. Por exemplo, na pandemia – período em que a população feminina foi duramente impactada, seja por estar na linha de frente, por perder mais emprego do que homens, por acumular ainda mais tarefas ou ainda por sofrer violências no ambiente doméstico.
Esses são problemas frutos de uma estrutura social que oprime mulheres, interferindo diretamente em suas possibilidades de vida e de emancipação. Parte deste sistema, o mercado de trabalho reproduz a mesma lógica: a diferença de remuneração entre homens e mulheres chegou a 22%, em 2022, segundo o IBGE; depois de se tornarem mães, quase metade das mulheres perde o emprego; alcançar a liderança nas empresas ainda é um grande desafio – segundo estudo da Grant Thornton, apesar de serem mais de 50% da população brasileira, mulheres ocupam 38% dos cargos de liderança. O cenário é ainda mais injusto quando consideramos as intersecções: mulheres pretas são apenas 3% em nível gerencial e cargos acima e enfrentam o racismo brutal em suas jornadas. Discriminações sobrepostas também impedem outros grupos minorizados, como mulheres trans e mulheres com deficiência de encontrar oportunidades e ascender na carreira.
O contexto exige ação para transformação. Exige romper com paradigmas que envolvem questões de gênero. Exige que empresas se mobilizem. Exige que a competência e presença de mulheres diversas seja valorizada e reconhecida. Aqui na Swood, além de um quadro de colaboradores com forte presença de mulheres, temos na liderança Julia Cohen, mulher, profissional e mãe, que conduz um negócio buscando fortalecer todas que estão à sua volta e a retribuir a mesma inspiração que encontra em outras.
A seguir, batemos um papo com a Ju para ela compartilhar a sua experiência à frente da Swood, na liderança e no maternar. Espie só!
Quais os desafios você entende que enfrentou por ser mulher no mercado de trabalho? Algum episódio marcou sua experiência?
Honestamente, eu acho que tive sorte nesse quesito. Não lembro de nenhum episódio marcante desse gênero, além do óbvio de ser a única mulher diversas vezes em eventos, reuniões etc. Porém, tendo consciência do machismo e do preconceito que ainda existe, também sempre me preparei muito bem para as situações que iria enfrentar, justamente para tentar dar o mínimo de margem possível. E claro que também já vivi aquele clássico de estar numa reunião com outras pessoas do meu time (homens) e o pessoal de fora se direcionar mais para eles até descobrirem que a palavra final era minha.
Quando você iniciou a sua vida profissional, já pensava em ocupar a liderança? Como isso despertou em você?
Sempre pensei que iria construir carreira em alguma grande empresa até chegar num cargo de liderança, porém, nunca imaginei que seria dona do meu próprio negócio. A verdade é que eu fui atleta durante muitos anos e aprendi desde muito nova a assumir a responsabilidade, a pensar no melhor para o grupo e quando percebia, de alguma forma, já estava sempre liderando. Talvez em parte seja porque sempre fui muito mandona – risos – mas com o tempo fui aprendendo que ser líder é muito mais do que saber pedir/mandar.
Há uma visão de que a maternidade é um obstáculo para mulheres ascenderem em suas carreiras. O que você acredita que pode desconstruir esse preconceito?
A questão é que as pessoas veem a maternidade como um problema, mas não é ela que dificulta o dia a dia das mulheres. O problema está em todo o resto. A carga emocional é gigantesca, e a nossa cabeça está sempre ocupada. Ou é o trabalho, ou é o jantar, ou a fralda que está acabando ou a conta que tinha que pagar. O problema é que vivemos em uma sociedade que acha maravilhoso homens que ajudam as mulheres. O erro já nasce daí, na origem, no verbo. Homens não têm que ajudar, eles têm que fazer o seu papel. Se isso começasse a acontecer, mulheres teriam uma vida muito mais equilibrada e tranquila. Não estou querendo fantasiar dizendo que é ou seria fácil. Ser mãe, trabalhar, cuidar da casa, em alguns casos ainda estudar, é difícil pra caramba. Mas como tudo na vida vamos aprendendo a escolher, equilibrar e priorizar. E quando temos alguém pra dividir o peso da sacola, fica sempre menos complicado, além de, no caso dos filhos, ser o justo, né?
Quais caminhos você encontra para conciliar a vida pessoal, familiar e de CEO de uma empresa?
A verdade é que eu vivo em constante malabarismo. E não tem jeito, um prato sempre está mais alto que o outro, e tudo bem. Ou seja, vai ter dias em que trabalho mais e cuido menos de mim. Outros em que a casa está uma zona, mas as reuniões foram um sucesso e as sonecas do bebê também. Enfim, o que tem funcionado pra mim é:
- Não se cobrar tanto. Saber que estou dando o meu melhor e que nem todo dia esse melhor é igual.
- Confiar no meu time. Seja ele o profissional ou o de vida. É impossível fazermos tudo sozinhas. Por isso, precisamos aprender a delegar e aceitar que as pessoas vão dar o seu melhor e que não necessariamente vão fazer igual a você.
- Um dia de cada vez. O sol sempre se põe e amanhã é outro dia. No meio de um furacão, é sempre bom lembrar que tudo passa.
Em quais aspectos você acredita que a Gestão de Pessoas das organizações podem cuidar melhor de mulheres, em suas pluralidades – mães, trans, PcD, pretas.
Primeiro, reconhecendo que ainda há muita desigualdade e que o mundo ainda é muito machista e injusto. A partir daí, tentar ouvir o que as mulheres necessitam dando espaço para fala, troca de opiniões que gerem em ações de fato. Exemplo: ter uma sala de amamentação para que mulheres possam retirar e armazenar o leite materno ainda é tabu em muitos lugares.
Além disso, investir na conscientização dos colaboradores homens sobre os problemas reais que ainda existem – novamente abrindo espaço para diálogo. Por fim, mas não menos importante, se preocupar em oferecer as mesmas condições de trabalho e oportunidades com equidade.
De que forma outras mulheres inspiram você?
Poderia ficar horas aqui escrevendo sobre isso. São tantos e tantos exemplos e modelos inspiradores. Mas com certeza minha mãe, avós, tia, melhores amigas. As mulheres que estão/estiveram mais presentes na minha vida são inspiração demais pra mim. Seja pela inteligência, disciplina, coragem, habilidade. É fundamental ter essas inspirações e perceber como podemos tudo!
Deixe uma mensagem para mulheres que desejam ocupar cargos de liderança ou empreender.
Na minha visão, liderar e empreender são coisas bem distintas. Assim acho que nesse caso valem duas mensagens diferentes. Pra você, mulher que quer empreender, coragem! Nós somos capazes de tudo, principalmente quando acreditamos em nós mesmas. A estrada é dura e com muitos altos e baixos. Mas siga, um dia de cada vez, trabalhando rumo ao seu propósito que você conseguirá chegar lá.
Para aquelas que desejam ocupar um cargo de liderança: continuem o trabalho duro. Mostre o quanto vocês são boas no que fazem e pensem fora da caixa. Ignorem quem que nos chamam de loucas, ríspidas ou grossas. Somos tão ou mais capazes que qualquer um para fazer aquilo que queremos.
E para todas, apoiem-se! Sororidade sempre. Há espaço para todas nós e juntas seremos sempre mais fortes.
Este nosso conteúdo foi desenvolvido para marcar o Dia Internacional da Mulher, 8 de março, mas vale para todos os outros dias. Afinal, equidade de gênero, valorização da mulher no mercado de trabalho e liderança feminina são temas que não podem cair no esquecimento ou ficar somente no discurso.
Esperamos que tenham gostado e façam parte da mudança com a gente. Até a próxima!